“Ainda sem grandes pormenores, Centeno explicou que o desenho da condição de recursos "não está feito", mas garantiu que abarcará "todas as dimensões não contributivas da política social que progressivamente vão ser sujeitas" à prova de rendimento.”
Esta política, aplicada às pensões mínimas, é uma política neoliberal. Infelizmente,
também tem apoiantes à esquerda, dentro e fora do governo. Por aqui também
passa a linha de demarcação entre esquerda e direita.
Para a
esquerda, o trabalho é constitutivo de direitos. Mesmo quando o sistema de
segurança social não estava ainda organizado por forma a cobrir todas as
actividades produtivas, mais ou menos informais, quem trabalhou e não fez os descontos
suficientes para alcançar uma pensão que a sociedade considere minimamente
digna, constituiu o direito a essa pensão. O facto de uma parcela dessa pensão
ser financiada pelo Orçamento do Estado para que alcance um nível mínimo não altera a natureza da pensão na sua totalidade:
um direito.
Se, pelas
mais diversas razões, ao longo da vida o trabalhador obteve fontes de
rendimento que não resultaram do seu trabalho (herdou
propriedades, casou com alguém que tinha património, ganhou o euromilhões, etc.
), elas não anulam o seu direito à pensão.
A pensão
é um direito à segurança na velhice e tem por objectivo central manter o nível
de vida do trabalhador quando este já não pode trabalhar. Não tem por objectivo
reduzir a pobreza. Para isso, há outros instrumentos de política social que,
naturalmente, estão “sujeitos à condição de recursos”. Aos que estão muito
preocupados com a existência de pensões mínimas recebidas “por quem não
precisa”, recordo que o IRS também engloba as pensões e que, infelizmente,
não tem a progressividade que deveria ter numa sociedade decente. Pois bem,
preocupem-se com a justiça fiscal e com uma política económica promotora do
pleno emprego, em vez de atacar o direito à pensão. Todo este frenesim para ver
se ainda é possível fazer mais poupanças, mesmo que à custa da eliminação do
direito à pensão mínima nas suas diferentes versões, é revelador de um facto dramático: aceitar jogar as regras orçamentais
da UE é aceitar a eliminação do direito à pensão em nome da prioridade da assistência aos pobres.
Para os
que, à esquerda, querem ter uma opinião informada, remeto para um artigo de
leitura obrigatória:
O direito a um nível mínimo de pensão de reforma – direito construído a partir do trabalho e garantido incondicionalmente aos trabalhadores – poderá ser revogado e, em sua substituição, instituído um programa de prestações selectivas para idosos. A noção de solidariedade que esteve na base do reconhecimento do direito poderá ser abandonada, deixando de se exprimir em relação a um colectivo (os trabalhadores na reforma), para ser substituída por uma noção de solidariedade com os indivíduos (idosos) em situação de necessidade. A escolha implícita é o desenvolvimento da assistência.”